quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Dos Músicos

Caríssimos,

Tenho ouvido ao longo dos anos expressões como "os músicos são pessoas difíceis" ou "os músicos são uma raça do caraças". Pois... Percebo que se possa pensar isso. Mas reparem que não é bem assim.

Além de ser músico, lido com os meus colegas numa base diária há, pelo menos 17 anos. E que fique claro que tudo o que aqui escrever aplica-se também a mim. Mais: aplica-se, primeiro que tudo, a mim. Não sou especial, nem melhor, nem pior do que os outros. Poderei eventualmente ser diferente. Mas isso cabe, a quem me conhece, avaliar.

Não devemos esquecer que, associado a um músico está sempre um artista. Os que dizem que não são artistas, ou são mentirosos, ou são técnicos de música. E, neste último caso, não são músicos na sua acepção total. Tocar é uma coisa. Debitar notas de forma mecânica é outra.

A palavra artista traz consigo uma série de dimensões que, essas sim, podem ser difíceis de perceber. E, ou se tem pachorra para tentar perceber, ou não se tem. Tudo o que seja artista tem uma visão empolada da realidade. Ou de algumas vertentes da realidade. Tem a noção de como quer mostrar a sua arte às pessoas. Sabe de que condições precisa para tocar de forma descontraída e sentida, sem se preocupar com coisas que, se não estiverem de acordo, podem prejudicar a sua actuação. E acreditem que, se as condições forem satisfeitas, todos ganham. O Público, o Promotor do Evento e o Artista. Não há maneira de haver perdas. :)

Deve haver paciência, tolerância e aceitação quando se lida com músicos. E os músicos devem ter estas mesmas características quando lidam com não músicos. É tudo uma questão de adaptação e de bom senso. O que não pode haver é posições de força e braços de ferro tontos. Porque não se ganha rigorosamente nada.

Infelizmente, as noções de ego gigante e de mau-feitio também estão associadas aos músicos. Também conheço pessoas assim. Mas são facilmente identificáveis. E com estes as conversas devem ser claras, firmes e inequívocas. Porque se não forem, toda a relação daí para a frente torna-se tensa e contra-producente. E aí todos perdem. 

Tenho um colega e amigo músico que diz que "para falar com um músico sem criar fricções, é preciso saber o que é um Fá Sustenido". Pode não ser assim tão linear. Mas o princípio é exactamente este. Se falarmos com um artista sem mostrarmos interesse pelas especificações da profissão e sem sensibilidade por tudo o que é preciso para se mostrar arte, corremos o risco de levar com maus-feitios. Se o promotor de um evento se preocupa essencialmente em rentabilizar o que gastou e em ter clientes felizes, o artista preocupa-se só com as condições que ele considera adequadas (ou mínimas) para apresentar o seu trabalho ao seu público. E é da sensibilidade e do bom senso de ambos que nasce o entendimento que, regra geral, traz boas relações profissionais. Posso dar-vos um exemplo: se vou tocar num hotel, não posso exigir um palco com 10 metros de frente. Preciso de ter o bom senso de me adaptar às condições que existem. Posso (e devo), no máximo, apresentar sugestões para uma melhoria das condições. Por outro lado, não deve o hotel esperar que eu toque com umas colunas do tamanho de um rádio a pilhas. Ou com equipamento de som que funcione mal. Nestes casos, reclamar ou não fazer a actuação não é ser complicado. É ter bom senso. Porque se assim não for, quem nos ouve não vai gostar. E quem está no palco não é o promotor. É o artista. E ele é que será, perante o público, responsável pela porcaria que este acabou de ouvir.

Se os músicos são especiais? São sim senhor. Dominam uma arte que transmite emoção, alegria e diversão às pessoas. Mas são pessoas normais, com preocupações normais. Não devem, em circunstância alguma, ACHAR-SE especiais. Isso cabe a quem os ouve. E são pessoas que trabalham (uns mais que outros) para que todos saiam contentes. Porque músico que não trabalhe para si, para o seu Público e em harmonia com o Promotor do Evento, tem alguma coisa de errado.

Beijos & Abraços,

MP


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