sábado, 5 de outubro de 2013

Do Trabalho Honesto

Meus Caros,

Este texto tem origem em algumas vivências recentes. E é também um assunto sobre o qual sempre quis escrever.

Penso que, antes de se começar qualquer trabalho (seja em que área for), há que validar internamente (de si para si) a honestidade do mesmo. Simples: é trabalho honesto ou não? Ao fazê-lo estarei a enganar alguém? Ou a mim próprio? Estarei a fazer alguma coisa para a qual não sou qualificado? Se, depois de feita esta análise, estivermos de consciência limpa em relação a todas estas questões, então que se avance. Sem receios e sem medo de críticas ressabiadas e descabidas de quem, por um motivo qualquer, ache por bem opinar. Para mim qualquer trabalho só pode ser exercido com motivação quando nos sentimos bem e tranquilos ao fazê-lo. Se assim não for, mais cedo ou mais tarde, dá asneira. Porque se torna, para quem é consciente e tem princípios, insuportável.

Infelizmente não basta ter a consciência da honestidade da coisa. É preciso também pensar se temos capacidade para o fazer. Se houver consciência das limitações que temos, a análise deste ponto será pro-activa e evita chatices e embaraços. Se essa consciência for inexistente, caberá à vida, mais cedo ou mais tarde, voltar a por as coisas e as pessoas nos seus lugares. Mas isso já é outra conversa, para outro texto.

Procurei ter sempre esta honestidade em tudo o que fiz na vida. Há quem diga mesmo que perdi algumas coisas por ser demasiado "agarrado" a esta ideia de honestidade. Poderão até ter razão. Mas é daquelas coisas das quais não abdico.

Para ilustrar o meu ponto de vista, posso dar-vos um exemplo. Eu sou cantor, pianista, locutor e, aqui e ali, toco um bocadinho de viola-baixo. Mas só um bocadinho mesmo. Nada de especial. Na profissão que exerço apresento-me em vários formatos e com várias formações. Tenho um trabalho a solo, só como cantor, acompanhado por instrumentais pré-gravados. Tenho outro, também a solo, como pianista/ cantor, no qual toco piano e canto. Tenho um trio com um baterista e um baixista. E canto também com uma big band. Antes de me dedicar e começar o trabalho de casa que qualquer destes formatos exige, fiz a tal reflexão da honestidade. E cheguei à conclusão que sim, que são trabalhos honestos. Porque só canto ou toco temas que estou habilitado e preparado para tocar. E porque, acima de tudo, não engano ninguém. Não finjo que estou a tocar um instrumento que, afinal, não estou a tocar. Bem ou mal (decidem vocês) faço o que me propus a fazer. Se é para tocar, toco. Se é para cantar, canto. Se é para fazer as duas coisas, faço.

Quem acompanhou a evolução da tecnologia musical ao longo dos últimos anos sabe que é cada vez mais fácil apresentar-se como "músico" e fingir que se toca um instrumento. Considero isso uma fraude vergonhosa que devia ser punida por lei. Porque, não tenham dúvidas, é disso que se trata: de uma fraude.

Cabe a mim, como profissional de Música, adaptar-me ao mercado no qual estiu inserido. Se quem me contrata quer um cantor, eu apresento-me a solo, como cantor. Se querem um pianista/ cantor, também faço. Se querem um trio, levo a minha malta. Se quiserem um guitarrista, lamento mas não posso fazer. Porque não sei fazer. Mas há quem o faça muito bem.

O que me entristece é que se queira denegrir trabalhos honestos. Atacando-os como se fossem causadores de algum mal. A revolta, o desespero e a falta de alguma frieza de raciocínio podem levar-nos a opiniões e a atitudes injustas, cruéis e perfeitamente descabidas. Que podem até vir de quem tenha memória curta ou, pior do que isso, selectiva. E o problema é que, quanto mais pequeno é o meio no qual vivemos, mas eco essas vozes podem ter. E mais estragos podem fazer em vidas e em mercados que se querem sãos e de concorrência livre.

Assim sendo, penso que não devemos descarregar nos outros (e em quem não nos fez mal nenhum) as frustrações que a vida nos traga. O trabalho dos outros não pode (nem deve) ser motivo para a nossa falta de preparação, de talento e de trabalho. Nem pode ser motivo para a falta de oportunidades que, em várias alturas da nossa vida, acontece.

Conheço casos evidentes e gritantes de colegas que, pura e simplesmente, não têm trabalho. E são dotados de um talento incrível. Isto sim é uma injustiça. E a estes procuro ajudar sempre. Mas não o faço forçando o mercado a aceitá-los. Faço-o (e já o diz muitas vezes) tentando criar oportunidades para que eles trabalhem e possam ser vistos por quem tem o poder de tomar decisões. Quem me conhece e lida comigo, sabe perfeitamente do que falo.

Posto isto: em frente!

Beijos & Abraços,

MP

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